“Lavadinha na campa, senhor?”, o trabalho infantil em cemitérios

Por todo o Brasil, crianças e adolescentes vão aos cemitérios nos dias mais movimentados e oferecem aos visitantes o serviço de limpeza das lápides de seus entes queridos

Por Igor Ojeda, da Repórter Brasil

Boné bordado com o rosto sorridente do Coringa (o inimigo do Batman), camiseta vermelha estampada, bermuda escura de surfista, fitinha do Senhor do Bonfim no tornozelo… pés descalços. O garoto tímido, de seus 12 anos, sobe na lápide suja e começa a varrer as folhas secas que a cobrem. “Vou pegar água”, diz. Desce, pega o balde laranja e some por alguns minutos pelo “labirinto” do cemitério da Quarta Parada, no bairro da Água Rasa, Zona Leste de São Paulo (SP). Com esforço, volta segurando o recipiente quase transbordando e começa a despejar seu conteúdo sobre a lápide.

Em seguida, espalha dois tipos de detergentes sobre o local, pega a vassoura e esfrega. Nada escapa, nem mesmo a imagem de Nossa Senhora que adorna o túmulo. Joga um pouco mais de água e começa a tirar o excesso com a ajuda de um rodo. Mais água, mais rodo. Enrola neste um pano de chão com aspecto de recém-comprado e o esfrega na superfície úmida. “Acho que pode jogar mais um pouco de água, não?”, pergunta a senhora que “contratou” o serviço. O menino desce, pega o balde e some novamente.

Fotos: Igor Ojeda

Garotos dormem na rua para poder estar no cemitério cedo em Finados e Dia das Mães. Fotos: Igor Ojeda

Assim como ele, outras dezenas de crianças e adolescentes faziam o mesmo trabalho, no mesmo cemitério e no exato momento, um domingo, 12 de maio, Dias das Mães. Na manhã desse dia, a Repórter Brasil visitou três cemitérios na capital paulista. No da Quarta Parada presenciou grande incidência de trabalho infantil. Nos outros dois – o da Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte, e o da Consolação, na região central –, testemunhou apenas adultos trabalhando.

A reportagem procurou os responsáveis pelo Serviço Funerário do Município de São Paulo (SFMSP), que, em nota, afirmaram que a administração “não permite, em nenhuma hipótese, a atuação de menores prestando qualquer serviço dentro das necrópoles municipais”. O texto diz ainda que em datas especiais a Prefeitura solicita “intensificação das rondas realizadas pela Guarda Civil Metropolitana e pela Polícia Militar nos 22 cemitérios municipais”. Por fim, o Serviço Funerário pedem que população que acione “o Conselho Tutelar como forma de ajudar no combate ao trabalho infantil”, e destacam que “é fundamental que haja a conscientização dos pais e responsáveis para os malefícios da prática, e que estes cobrem a permanência dos meninos e meninas na escola como forma de evitar o trabalho precoce.”

“A OIT [Organização Internacional do Trabalho] classifica a atividade de crianças em cemitérios como umas das piores formas de trabalho infantil. A pessoa com menos de 18 anos não pode exercê-la”, lembra a procuradora Regina Duarte da Silva, coordenadora da Coordinfância (Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes) na Procuradoria Regional do Trabalho, 15ª Região (Ribeirão Preto), órgão vinculado ao Ministério Público do Trabalho (MPT). Tal atividade para menores de idade é proibida pelo decreto presidencial 6.481 de 2008, que lista as piores formas de trabalho infantil (Lista TIP). Por todo o Brasil, há notícias de que esse tipo de violação ocorre, especialmente nos dias de Finados, das Mães e dos Pais, quando o movimento costuma ser maior. Poucas, no entanto, são as ações de prevenção e repressão à prática.

Dormir na rua
O garoto tímido não estava sozinho no cemitério da Quarta Parada. Fazia parte de um grupo grande, de dez meninos com idades entre 11 e 14 anos, todos moradores do bairro de Pirituba, Zona Norte. Haviam chegado na sexta-feira à noite, para poderem trabalhar desde cedo no sábado, quando a demanda por lápides limpas de entes queridos começa a crescer. Nas duas noites, dormiram na rua. “Passamos frio, para falar a verdade. A gente forra as cobertas no chão e dorme. Trazemos só cobertas e roupas. Durante o dia as guardamos num canto”, conta Felipe*, de 12 anos.

“Lavadinha na campa, senhor?”, repete João* a cada pessoa que entra no cemitério. Para cada túmulo limpo, cobra R$ 10. O menino de 13 anos encosta num carro estacionado enquanto segura balde, vassoura, pano, rodo e produtos de limpeza. É o terceiro ano que ele faz esse tipo de serviço. Ele conta que no Dia das Mães é cansativo, mas o maior movimento é em Finados. “É quando tem mais trabalho.” Num dia como esse, os meninos trabalham das seis da manhã às seis da tarde. Almoçam correndo uma refeição de R$ 8 num bar próximo, que pagam com o dinheiro que ganham com a limpeza das lápides. “A gente trabalha igual a um condenado”, admite. Num fim de semana como o do último domingo, os garotos ganham de R$ 50 a R$ 100. No feriado de Finados, esse valor pode subir a R$ 200. “No último Finados eu ganhei R$ 200”, conta Felipe. “Tem gente que faz R$ 700. A gente cansa mais, tem de carregar muitos baldes com água.”

Garotos dormem na rua para poder estar no cemitério cedo em datas como Finados e Dia das Mães

Descalços, sem botas ou proteção adequada, com os pés sobre o detergente usado para deixar tudo brilhando

João diz que os pais sabem onde estão durante o fim de semana e não impõem restrições. “Nós que tivemos a ideia de trabalhar com isso. Queremos ganhar dinheiro para comprar roupa. Não queremos ficar dependendo de nossos pais”, explica. Especialistas alertam que o Censo de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, apontou que no âmbito urbano muito do trabalho infantil está ligado à questão do consumismo em crianças e adolescentes, que buscam bens que não recebem em casa. Nos demais dias do ano, muitas vezes Felipe e João arrumam bicos em lava-rápidos de Pirituba, outra atividade presente na lista de piores formas de trabalho infantil. “Gostamos também de comprar coisas para levar para dentro de casa, como alimento”, explica Felipe, enquanto dois de seus amigos brincam de espada com os cabos das vassouras. Perguntado se vale a pena, o menino faz cara de enfadado: “Vale a pena não. Você é louco, ficar passando a noite na rua? Né, não? A gente veio porque não tinha nada para fazer. Estamos duros também… ganhamos mais dinheiro aqui do que no lava-rápido, onde dá R$ 20, R$ 30 por dia, trabalhando das oito da manhã às seis da tarde”.

Por todo o Brasil
O problema não se restringe à cidade de São Paulo. Nos últimos anos, inúmeras denúncias têm surgido na imprensa de trabalho infantil em cemitérios de todo o país. Passe o cursor sobre os ícones abaixo e movimente o mapa para ler mais sobre outros casos e também iniciativas de prevenção:

A triste situação em João Pessoa, na Paraíba, motivou a realização de um estudo em 2003 conduzido por Nerise R. Andrade Veloso, secretária do Conselho Tutelar da cidade, e Sarita Brazão Vieira, doutora em Saúde Mental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e professora e pesquisadora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Em artigo para o livro “Crianças e adolescentes que trabalham: cenas de uma realidade negada” (clique aqui para baixar versão digital em PDF), elas relatam os resultados das entrevistas feitas com quatro meninos e uma menina, com idades entre 11 a 17 anos, que trabalhavam nos cemitérios locais. Os garotos exerciam diversas atividades, como limpar túmulos, cavar covas e, inclusive, ajudar em pequenas construções. Um eles relatou até ter participado da exumação de um cadáver.

“Todas essas atividades são realizadas praticamente sem nenhuma orientação, sem proteção, sem equipamentos de segurança, simplesmente fazem da maneira que querem, na posição que acharem mais cômoda. Quanto à jornada de trabalho, eles normalmente trabalham de 4 a 12 horas por dia e recebem de R$ 10 a R$ 15”, escrevem. Segundo as autoras, o trabalho infantil em cemitérios, além de tudo, obriga as crianças e adolescentes a conviverem de perto com a morte, o choro e a tristeza.

“Todo esse ambiente mórbido, sem eles perceberem, os transforma em pessoas insensíveis quando se fala em morte. Para esses meninos e essas meninas não existe tristeza, não existe medo, mas ao mesmo tempo não querem morrer, querem viver, mesmo vivendo uma realidade não entendida nem aceita”

Trecho do estudo “Crianças e adolescentes que trabalham:
cenas de uma realidade negada”

A procuradora Regina Duarte da Silva concorda: “Pode causar abalos psicológicos, pois o cemitério é um local de sofrimento de dor, não é lugar propício à permanência de crianças”, diz. Felipe, um dos meninos que limpam lápides no Quarta Parada, em São Paulo, admite. “É um peso nas costas, né não? Ficar vendo os outros enterrados…”.

Avanço em Campinas
Entre os dias 10 e 19, Regina participou de uma força-tarefa de prevenção ao trabalho infantil na limpeza de lápide em Campinas, no interior de São Paulo. Formado por MPT, prefeitura, Guarda Municipal, Polícia Militar estadual e representantes dos cemitérios do município, o grupo buscou dar orientação a todos os envolvidos na prática: crianças e adolescentes, pais e as pessoas que “contratam” o serviço. A denúncia da existência dessa situação foi feita pela ONG Movimento Vida Melhor (MVM), especializada em assistência social a vítimas de trabalho infantil.

Faixa da campanha em Campinas. Divulgação: Movimento Vida Melhor

Faixa da campanha em Campinas. Divulgação: Movimento Vida Melhor

De acordo com a entidade, na cidade as crianças recebem de R$ 5 a R$ 10 por lápide limpa e utilizam para tal uma solução ácida composta de vinagre e limão, que pode causar queimaduras. No último Dia de Finados, em novembro do ano passado, foram encontrados 21 meninos com idades entre 11 e 15 anos – realizando esse tipo de trabalho. Alguns  acompanhavam os pais, que vendiam flores no lado de fora, enquanto outros eram explorados por traficantes, que obrigam as crianças a repassarem o dinheiro ganho com a limpeza.

No Dia das Mães deste ano, no entanto, a realidade foi completamente diferente. “O resultado da fiscalização foi excepcional”, comemora Mário Seixas, superintendente-geral do MVM. Segundo ele, nenhum menor foi visto trabalhando nos cemitérios de Campinas: 14 crianças que realizariam a atividade foram abordadas, ouvidas, orientadas e encaminhadas para brinquedotecas montadas nos locais. “Acredito que essa ação vai se constituir em um modelo.” Em fevereiro, quando a força-tarefa começou a se formar, os cemitérios iniciaram uma campanha de conscientização para inibir o trabalho infantil, com orientação a funcionárias, afixamentos de faixas e distribuição de camisetas, além da montagem das brinquedotecas.

“A esmagadora maioria das pessoas aderiu, e as próprias crianças não reagiram mal. Foi além da expectativa. Como a causa é nobre, as coisas se justificam por si mesmo”, ressalta Seixas. Ele destaca que os familiares das 14 crianças serão contatados. O objetivo é compreender a realidade dos pais e buscar alternativas para desestimular o trabalho dos filhos.

* Nomes alterados para preservar a identidade dos entrevistados

Reportagem produzida em parceria com Promenino/Fundação Telefônica Vivo, e publicada também no site Promenino, que reúne mais informações sobre combate ao trabalho infantil

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“Às vezes, criança: um quase retrato de uma infância”

Auditores fiscais publicam livro com fotos e versos para tornar visível a realidade de meninas e meninos que, forçados a trabalhar, aos poucos perdem a infância

Por Guilherme Zocchio, da Repórter Brasil

“Menino que vai pra feira
Vender sua laranja até se acabar
Filho de mãe solteira
Cuja ignorância tem que sustentar
[…]
Compra laranja, laranja, laranja, doutor
Ainda dou uma de quebra pro senhor!”

(“O Menino das Laranjas” – Théo de Barros, música interpretada por Elis Regina)

Elis Regina eternizou o “menino das laranjas”, quando, com sua voz, trouxe à luz a história do garoto que todo dia acorda cedo para vender frutas e ajudar a mãe no sustento do lar. A música, composição de Theo de Barros, narra e repercute, já em 1965, um caso de exploração do trabalho infantil. Passados quase 50 anos, a canção ainda hoje toca nas rádios. Chama a atenção para um problema que, no dia a dia, persiste na cidade e no campo, mesmo despercebido, e sob outras formas: crianças que trabalham, em feiras, inclusive, por todo o Brasil.

Em certos contextos, a arte costuma ser o campo que expressa e reflete as contradições, valores e aspirações de uma sociedade, ao mesmo tempo em que também procura sensibilizar e dar dimensão a certos aspectos da conjuntura social. No caso do trabalho infantil, além de “O Menino das Laranjas”, na voz de Elis, o livro “Às vezes criança: um quase retrato de uma infância roubada”, de autoria dos auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) Rubervam Du Nascimento e Sérgio Carvalho, respectivamente com 35 anos e 18 anos de atividade profissional, aborda de modo muito parecido a exploração de crianças e adolescentes.

Fotos: Sérgio Carvalho / "Às vezes, criança" / ©

Fotos: Sérgio Carvalho / “Às vezes, criança” / ©

Através de poesias escritas por Rubervam e fotos capturadas por Sérgio, apresentam-se ao longo das páginas retratos da exploração de crianças e adolescentes que se veem compelidos a entrar mais cedo na vida adulta. Para ambos, a obra tenta retirar a invisibilidade e despertar a sensibilidade para o problema. “A ideia é exatamente mostrar que o trabalho infantil é bem visível para toda a sociedade, mas ao mesmo tempo não conseguimos percebê-lo. É uma realidade no dia a dia das pessoas, não só do auditor fiscal. Todo dia você vê crianças trabalhando. Isso virou normal para a sociedade”, afirma à Repórter Brasil o autor das fotografias na publicação.

A ideia é não só ajudar no despertar sobre a questão, mas também colocar o tema de uma forma que não pareça banal, exatamente o contrário de uma terapia de choque sobre a realidade em que não é possível vislumbrar qualquer saída para a situação presente. Abordar o trabalho infantil através da linguagem poética, portanto, é uma forma de reorganizar e transformar a percepção sobre o problema, de acordo com Rubervam. “Não há arma verbal mais poderosa para trabalhar com as subjetividades que nos envolvem no dia a dia do que a poesia”, defende. “É a poesia que, de todas as outras artes, se atreve a mexer com nosso sistema límbico, despertar os nossos sentimentos de dor e revolta adormecidos”.

“Dia a dia do cidadão”
“A grande maioria dessas fotos é feita no dia a dia do cidadão”, lembra Sérgio. Ele explica que as imagens ao longo do livro são na verdade frutos de suas viagens, passeios e andanças pelo país, e não registros da atividade que realiza como auditor fiscal do MTE, ao contrário do que pode parecer em uma primeira leitura. “A gente fez questão de não citar locais para não regionalizar, porque é um problema do país todo”. Essa iniciativa, acredita, vem justamente no sentido de problematizar o trabalho infantil como parte do universo dos brasileiros. “Se você legenda a imagem, parece que é um problema só daquele lugar que foi fotografado”, completa.

asvzscriancascOs retratos da exploração de crianças e adolescentes acompanham, além disso, imagens de meninas e meninos em momentos de brincadeira, como um respiro entre tantas situações de abuso e falta de perspectiva. “No livro, o normal vira a exceção: a quantidade de imagens de crianças trabalhando é muito maior do que a de crianças brincando. Também a ideia é mostrar o que deveria ser sua realidade”, afirma o fotógrafo. Enquanto a maior parte das imagens as mostra em casas de farinha, pedreiras, lixões, estradas e matadouros, uma minoria registra o sorriso delas, sem terem de carregar antecipadamente as preocupações e os riscos da vida adulta.

Para entender a situação que afeta milhões de crianças e adolescentes pelo país – são pelo menos 3,4 milhões de vítimas do trabalho infantil, segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no Censo de 2010 – de um modo que vai além do possibilitado pelo ofício de fiscal trabalhista, os autores salientam a importância das trocas e conversas que têm com os meninos e meninas. “Procuro sempre fotografar como participante, um tipo de fotografia que chamamos de ‘dialógica’, ao contrário do que chamam de ‘ladrão de imagens’”, conta Sérgio. Das imagens no livro, ele destaca o caso de um menino, na sua cidade natal, que trabalhava em um matadouro (veja box abaixo). “Na verdade, a fotografia é um processo, é uma troca entre o fotógrafo e o fotografado, principalmente para ter esse tipo de imagem”, acrescenta.

“Sempre converso com as crianças e adolescentes que retiro do trabalho irregular. Não é certo acreditar que elas trabalham porque querem. Trabalham porque são obrigadas”, reforça Rubervam. O fiscal do MTE lembra que a exploração de crianças e adolescentes está ligada a outros fatores, como a desigualdade social, o descaso de certos governantes e o silêncio sobre o problema, parte do que classifica como “discurso da miséria cultural secular que nos acompanha”. “O silêncio é uma praga de bico afiado que se enfia com uma força perversa em nosso tecido social. Com o silêncio é que a sociedade tenta embrulhar a realidade que a incomoda”, adverte.

asvzscriancasc2“Bandidos, e não mocinhos” ou preto-e-branco
“As crianças são vítimas do comportamento dos adultos, da incompetência e insensibilidade de gestores públicos que brincam com essa questão”, continua Rubervam, em referência às circunstâncias em que crianças e adolescentes aparecem como culpadas pela violência urbana ou então quando o senso comum insiste que seria melhor ver esses jovens inseridos no mundo do trabalho, quando na verdade deveriam estudar, brincar e seguir somente depois à vida adulta. Ele cobra mais responsabilidade de autoridades e dos próprios cidadãos quanto ao problema. “Nesse filme violento, é bom que assumamos, de uma vez por todas: todos nós somos bandidos, e não mocinhos”.

asvzscriancasc1É dessa realidade dura que o escritor diz buscar a fonte de seu trabalho poético. “A matéria-prima de minha poesia, nos últimos 30 anos de convivência com a escritura, tem a ver com o que consigo apalpar cheirar, devorar, no dia a dia, na tentativa de transformá-lo em objeto de expressão artística”, conta. Questionado por esta reportagem por que preferiu, no livro, fazer o registro em versos, e não em prosa, ele é enfático em defender seu tipo de linguagem. “Meus referenciais são poetas que ousam invadir universos que a maioria julga completos, mas que estão precisando, o tempo todo, ser decifrados, imaginados, provocados, corrigidos.”

Imagem: Reprodução / "Às Vezes

Clique para ampliar. (Imagem: Reprodução / “Às vezes, criança” / ©)

Da mesma forma, Sérgio explica a preferência que tem pelas imagens em preto-e-branco. Segundo entende, a ausência de cores permite mais plasticidade e dramaticidade para os retratos na publicação. Em vez de utilizar a fotografia como forma pura e simples de representação da realidade, deixa “sugerido” ao leitor a percepção daquilo que está acontecendo, procura usar as imagens “como um meio de transformação social”. “O preto-e-branco sugere mais. Quando foge da imagem-realidade, o preto e branco não só mostra como também sugere mais”, diz. No fundo, as imagens também aparecem como um tipo de poesia.

“E a poesia”, explica Rubervam, “é testemunha ímpar de conquistas universais, das histórias de amor e morte dos indivíduos”. Testemunha que, como a música de Elis Regina, permanece por gerações, para que o que passa agora não caia no esquecimento jamais.

asvzscriancasc3Sérgio Carvalho nasceu em Simplício Mendes, no Piauí. Na ocasião de uma das visitas que fez a sua cidade-natal, deparou-se com a situação retratada acima. Ele conta que lá, devido à falta de oportunidades de estudo e inserção social às crianças, o trabalho de carrasco nos matadouros da região aparece como perspectiva a muitas meninas e meninos, inclusive com a conivência do poder público. “Foi na cidade onde eu nasci. Era um ambiente de trabalho muito penoso, em um matadouro público, gerenciado pela própria prefeitura, crianças trabalhando com animais”, descreve. Na imagem, o garoto puxa as correntes onde ficam pendurados os cadáveres de animais mortos.


Reportagem produzida em parceria com Promenino/Fundação Telefônica Vivo, e publicada também no site Promenino, que reúne mais informações sobre combate ao trabalho infantil

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Trabalho infantil dispara em Goiás

No primeiro trimestre, fiscalização flagrou exploração de 123 crianças e adolescentes em Goiás, algumas submetidas a trabalhos degradantes, perigosos e insalubres

Por Daniel Santini, da Repórter Brasil

Crianças servindo cerveja e outras bebidas em bares durante a madrugada. Adolescentes operando máquinas e produtos químicos sem nenhuma proteção. Meninos de até 10 anos cumprindo longas jornadas para ganhar menos do que um salário mínimo, sem tempo para estudar ou descansar. Essas são algumas das histórias por trás do crescimento do número de flagrantes de exploração de crianças e adolescentes, identificado  no primeiro trimestre de 2013  em Goiás.

Levantamento divulgado nesta semana pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Goiás (SRTE/GO) indica que o trabalho infantil aumentou significativamente no estado este ano. De 1º de janeiro até 10 de abril, foram identificadas 123 vítimas, sendo 79 delas com idades entre 10 e 15 anos. Se a proporção se mantiver ao longo do ano, o número de flagrantes deve superar ainda no primeiro semestre o total de 2012, quando foram encontradas 219 crianças e adolescentes exploradas, e chegar a uma quantidade tão significativa quanto a de 2011, quando foram identificados 571 casos. Para comparação, em 2009 foram 93 e, em 2010, 203.

De acordo com Arquivaldo Bites, superintendente regional do Ministério do Trabalho e Emprego em Goiás, não aconteceram operações especiais ou ações específicas que justifiquem aumento tão significativo. Neste vídeo, produzido a partir de imagens da SRTE/GO, é possível ter uma ideia das condições em que os flagrantes aconteceram:


Imagens: SRTE/GO – Edição: Anali Dupré

“Nas cidades pequenas, tendo em vista a dificuldade de fazer fiscalizações constantes, muitos empresários pensam que não precisam observar a lei e temos constatado irregularidades constantes”, explica, ressaltando que o número é um indicativo da gravidade da situação. As fiscalizações em questão aconteceram em áreas urbanas em atividades tão diferentes quanto restaurantes, mecânicas, bares, confecção de tapeçarias e lavanderias. “São crianças trabalhando em condições insalubres, em serviços noturnos, de periculosidade, carregando peso”, afirma.

Adolescente descalço manuseando produtos químicos tóxicos em lavanderia. Images: Reprodução SRTE/GO

Adolescente descalço manuseando produtos químicos tóxicos em lavanderia. Images: Reprodução SRTE/GO

Perfil das vítimas
No Brasil, não é permitido nenhuma forma de trabalho infantil para crianças com idade até 14 anos. Adolescentes com mais de 14 anos podem trabalhar na condição de aprendiz.  “É comum a ideia de que se o jovem não trabalha vai virar vagabundo. Nós não concordamos com essa assertiva, é uma ideia ultrapassada”, afirma o superintendente. “A criança que trabalha em muitos casos acaba tendo o crescimento emocional, educacional e pessoal comprometido. Lugar de criança é na escola ou no prazer”, completa.

“Estamos falando de exploração para fins comerciais. Antigamente, crianças trabalhavam em serviços familiares, acompanhando os pais na zona rural, sem fins lucrativos em atividades de subsistência. Nenhum dos flagrantes foi assim, todos tinham um fundo empresarial. Lugar de criança não é no trabalho, ainda mais na situação de explorado. Nenhum dos garotos tinha carteira profissional, registro de aprendiz, direito de estudar ou descansar. Todos estavam com carga horária excessiva, muitos em locais insalubres e perigosos”, ressalta.

Diante desse problema, as autoridades do estado estão articulando o Fórum Goiano para Erradicação do Trabalho Infantil, frente que deve reunir representantes de diferentes pastas do governo estadual, prefeituras e Ministério Público, além de empresários e integrantes da sociedade civil.

Garoto de 12 anos presta depoimento para auditor fiscal

Reportagem produzida em parceria com Promenino/Fundação Telefônica Vivo, e publicada também no site Promenino, que reúne mais informações sobre combate ao trabalho infantil

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Pequenas domésticas, a violação invisível

Mais de 250 mil crianças e adolescentes realizam trabalhos domésticos no país, situação “aceita” pela sociedade e de difícil fiscalização. Quase 94% desse total são meninas

Por Igor Ojeda, da Repórter Brasil

Todos os dias, quando Cristina* acordava, o mundo ainda estava escuro. Era rotina: inclusive aos sábados e domingos, a garota de 12 anos levantava às quatro e meia da madrugada. Não dava tempo de ficar rolando na cama. Tinha de se aprontar logo e ir ao restaurante da tia ajudar com a arrumação. Só três horas depois, por volta das sete e meia da manhã, é que tomava banho para ir à escola.

Na hora do almoço, voltava ao restaurante, onde ficava até as quatro e meia da tarde limpando, ajudando no caixa, fazendo entrega. Mas seu expediente não terminava aí. Retornava à casa da tia e levava mais duas horas limpando, lavando, passando. Depois, jantava, fazia a lição de casa e ia para a cama. No dia seguinte, às quatro e meia, o despertador tocava…

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em setembro de 2011 haviam pouco mais de 250 mil crianças e adolescentes exercendo trabalhos domésticos por todo o Brasil: 67 mil na faixa 10 a 14 anos, 190 mil na faixa de 15 a 17 anos. Apesar de as trabalhadoras desse setor terem alcançado uma vitória histórica recentemente, com a entrada em vigor, no dia 3, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que garante os mesmos direitos trabalhistas de outros segmentos, o trabalho infantil doméstico ainda carece de visibilidade: especialistas destacam que esse é um problema que, apesar de grave, permanece oculto.

O trabalho infantil doméstico é uma das atividades incluídas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP) criada pelo decreto 6.481, assinado em junho de 2008 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e baseado na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Constam da relação 89 atividades, com suas descrições e consequências para a saúde de crianças e adolescentes que as desempenham. “Por ter sido incluído na Lista TIP, o trabalho doméstico não pode ser exercido por pessoas que não completaram 18 anos”, explica Isa Oliveira, secretária-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI).

Cristina, que aos 12 anos começou a trabalhar de doméstica. Foto: divulgação/Cendhec

Cristina, que aos 12 anos começou a trabalhar de doméstica. Foto: divulgação/Cendhec

Mundo escuro
… com o mundo igual de escuro, Cristina acordava, e o martírio se repetia. Alguns meses antes, a pequena pernambucana morava com a mãe, o padrasto e a irmã de dois anos no bairro da Mangueira, no Recife – tinha mais quatro irmãos por parte de pai. Apenas estudava. A mãe, uma moça de seus trinta anos, era doméstica e sustentava as duas filhas com a ajuda do marido, que fazia coleta de sangue numa clínica na cidade.

Foi então que começou a ter problemas de coluna, o que a impediu de continuar trabalhando. Os gastos foram ficando cada vez mais apertados quando veio a “solução”: a irmã do pai de Cristina estava precisando de alguém para ajudá-la em casa e no restaurante. Mandou a filha com mala e tudo para o novo lar, não muito longe dali, também na Mangueira…

Isa Oliveira cita os dados do Censo 2010 para ilustrar a gravidade da situação. Em todo o Brasil, das estimadas 3,4 milhões de crianças e adolescentes trabalhando, 7,5% realizam serviços domésticos. A região Centro-Oeste é a de pior incidência em números proporcionais (9%), seguida das regiões Norte (8,5%), Nordeste (8%), Sudeste (7%) e Sul (6%). Ela chama a atenção, no entanto, para a evidente subnotificação de casos.

“Esses dados não expressam toda a dimensão do problema porque o Censo não coleta informações sobre os afazeres domésticos, ou seja, o trabalho infantil doméstico nas próprias casas das crianças. Há uma dificuldade em relação a esse registro, porque na maioria das vezes não é identificado como trabalho, e sim como ajuda. Como as pesquisas são por autodeclaração, muitas vezes o adulto informa que as crianças não trabalham, porque o conceito de trabalho está ligado à remuneração. Porém, no caso de trabalho infantil doméstico, isso não é determinante, não há essa relação direta”, esclarece a secretária-executiva do FNPETI.

Rotina
… Cristina ia caminhando da casa da tia até o restaurante, no Jardim São Paulo, e do restaurante para a casa da tia. Andava também até a escola. Aos sábados, como não precisava estudar, trabalhava o dia todo, até as nove e meia da noite. Aos domingos, cumpria expediente até o meio-dia. Eram poucas as horas livres. Aproveitava para visitar a mãe, mas no mesmo dia à noite tinha de voltar. Afinal, na segunda-feira, às quatro e meia da madrugada… era hora de pegar no batente.

Por todo esse serviço, a menina recebia R$ 20 mensais. Não reclamava. A mãe tampouco, pois pensava que a irmã do pai de sua filha comprava tudo que ela precisava, como roupas novas. Cristina dava metade do que recebia à mãe, e ficava com a outra metade. Quando precisava de mais dinheiro, pedia ao pai. Para completar, a tia e o marido a tratavam mal diariamente. “Me xingavam de vagabunda porque eu não fazia o trabalho direito. Diziam que como estavam pagando, era para eu fazer direito”, conta. A pequena não aguentava mais…

De acordo com a Pnad 2011, do total das crianças e adolescentes no trabalho infantil doméstico no Brasil, 93,8% são meninas. Chama a atenção também o fato de a grande maioria destas serem negras. Tal perfil, no entanto, não surpreende se levadas em conta as características do trabalho doméstico no país, independentemente da idade de quem o exerce. Na realidade, especialistas apontam que grande parte das domésticas adultas começou a trabalhar antes dos 18 anos. Paulo Lago, do Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec), de Recife, explica que a desigualdade social e a miséria são as primeiras causas dessa situação. “A mãe prefere entregar a filha para trabalhar numa casa de família a vê-la morrer de fome.”

Isa Oliveira destaca que tais motivações estão ligadas a outros fatores, como o pouco acesso das crianças à educação de qualidade, principalmente nos pequenos municípios da área rural, e, também, a baixa escolarização dos integrantes adultos das famílias, que não percebem a educação dos filhos como direito e oportunidade. Além disso, há uma forte naturalização do trabalho infantil doméstico no país. “Existe uma espécie de camuflagem da exploração nesses casos. No Nordeste e no Norte, é muito comum crianças serem levadas do interior para casas de famílias nas capitais. A exploração do trabalho fica oculta sob o manto da proteção: ‘a menina veio estudar, tem casa, comida’ etc. É difícil até que a própria família e as crianças compreendam a situação de exploração”, diz Isa.

Violência
… um dia, o marido da tia, um policial, levantou a sandália para Cristina. Mas ela tinha perdido o medo. “Ele ia me bater, mas comecei a xingá-lo, dei um chute nele e fui embora”, lembra. Foi para a casa do avô. A menina continuou indo ao restaurante, mas uma semana depois não apareceu mais. A irmã do seu pai, furiosa, jogou todas suas roupas na rua. Não importava: depois de quase um ano, Cristina estava livre.

Ou quase. No novo lar, continuou a fazer os serviços de casa, para ajudar a esposa do avô. Mas lá a situação era melhor. Era tratada muito bem e recebia R$ 100 por semana. Acordava mais tarde e ia direto para a escola. Mesmo assim, quando voltava na hora do almoço, trabalhava bastante, pois não era “dispensada” antes de lavar a louça do jantar…

Wanderlino Nogueira Neto recebe o Prêmio Direitos Humanos 2011, do governo federal, na categoria Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Wanderlino Nogueira Neto recebe o Prêmio Direitos Humanos 2011, do governo federal, na categoria Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Durante o Seminário Internacional Infância e Comunicação, realizado entre 6 e 8 de março deste ano em Brasília (DF), Wanderlino Nogueira Neto, representante brasileiro do Comitê dos Direitos da Criança da ONU, afirmou que em relação ao Nordeste é possível falar até em escravidão nos casos de trabalho doméstico infantil, por causa das condições absurdas a que as crianças são submetidas.

“No Nordeste, infelizmente ainda é comum escravidão no trabalho doméstico, inclusive com castigos físicos”, disse ele, que foi procurador-geral de Justiça da Bahia. “A situação afeta até mesmo familiares. Estamos falando de escravidão mesmo e entre as vítimas estão crianças, incluindo irmãos e irmãs mais novas. É uma situação em que espancamentos são comuns.”

A presidenta da Federação Nacional das Empregadas Domésticas (Fenatrad), a baiana Creuza Maria de Oliveira, sabe bem disso, já que sentiu na pele tais violações desde que começou a trabalhar como doméstica, quando tinha apenas dez anos. “Eu fui vítima de espancamento, de assédio moral, abuso sexual, ato libidinoso… a gente sabe que isso acontece, que no Nordeste as crianças e adolescentes domésticas comem o resto da comida da casa, para não jogar no lixo.” Creuza frisa que as consequências do trabalho infantil doméstico são gravíssimas. A começar pela saúde de quem tem menos de 18 anos, que realizam um tipo de trabalho incompatível com o que seus corpos ainda em desenvolvimento suportam e lidam diariamente com produtos químicos utilizados na limpeza das casas. “Além disso, há o abuso sexual e o assédio moral. A autoestima das meninas fica destruída. Elas crescem com complexo de inferioridade”, alerta. Isa Oliveira, do FNPETI, lembra que a fadiga causada pelo trabalho e jornada exaustivos comprometem não apenas a frequência escolar como também o desenvolvimento cognitivo das crianças.

Educação e saúde
… quando estava na casa da tia, Cristina sempre chegava com sono à escola. Invariavelmente perdia as duas primeiras aulas. No fim do ano, ficou de recuperação em três matérias. Mesmo que tenha trabalhado como doméstica por um período curto se comparado com a média, sua saúde não foi poupada. Por trabalhar muito em pé, seja na residência da irmã do pai ou no restaurante, hoje ela sente fortes dores no joelho. “Cheguei a ir ao médico e ele disse que eu preciso operar.”

Cerca de dois meses depois de ir para a casa do avô, uma vizinha entregou a sua mãe um folheto do projeto “Do trabalho infantil à participação”, do Cendhec, que reúne crianças e adolescentes entre 13 e 16 anos, moradores de comunidades de baixa renda do Recife e com histórico de trabalho infantil, para um processo de formação cujo objetivo é inseri-los nos espaços de formulação de políticas públicas relacionadas aos direitos de meninos e meninas. Cristina preencheu o formulário, fez a inscrição e foi selecionada. Voltou para a casa da mãe e parou de trabalhar…

Paulo Lago, do Cendhec, ressalta um aspecto delicado do problema do trabalho infantil doméstico: muitas vezes, é a própria mãe que põe a filha mais velha para tomar conta dos filhos mais novos enquanto sai para trabalhar – isso quando não chamam afilhadas ou filhas de vizinhos. Por isso, ele defende que é papel do Estado não somente tirar as crianças das situações de trabalho infantil, mas também atuar pelo fortalecimento das famílias de baixa renda, como sua inserção em programas sociais e a construção de creches, para que os pais tenham onde deixar os filhos durante o dia. Creuza, da Fenatrad, destaca que, além das creches, é preciso pensar em escolas de tempo integral, onde crianças e adolescentes possam, além de estudar, realizar outras atividades, como esportes e cursos de línguas.

Creuza Maria de Oliveira, presidenta da Fenatrad. Foto: Valter Campanato/ABr

Creuza Maria de Oliveira, presidenta da Fenatrad. Foto: Valter Campanato/ABr

Outro grande obstáculo à luta contra o trabalho infantil doméstico, além da precariedade de políticas públicas preventivas, é a extrema dificuldade de fiscalização das situações de vulnerabilidade. “Esse tipo de violação acontece no interior do lar, que é inviolável segundo a Constituição. Por isso é importante que órgãos como Conselhos Tutelares, Ministério Público do Trabalho denunciem esses casos e busquem alternativas e maior divulgação do problema”, diz Isa Oliveira, do FNPETI, cuja campanha contra o trabalho infantil de junho deste ano terá como mote justamente o trabalho doméstico infantil.

Direitos
… No projeto do Cendhec desde junho do ano passado, para onde vai todas as quartas-feiras, Cristina aprendeu, na teoria, as consequências do trabalho infantil. Participou de formações, por exemplo, sobre direitos de crianças e adolescentes, atuação dos Conselhos Tutelares e violência doméstica e sexual. Também esteve em oficinas sobre comunicação, para poder exercitar uma visão críticas sobre os meios de informação.

Aos 14 anos, a menina vê sua vida melhorar. A mãe, após um tratamento bem-sucedido, parou de sentir dores na coluna e voltou a trabalhar – faz serviços gerais em uma creche. Cristina não precisa mais ajudá-la. Hoje, a única obrigação é ir à escola.

* nome alterado para preservar a identidade da entrevistada
Imagem de abertura: Reprodução/Campanha FNPETI contra trabalho infantil doméstico

Reportagem produzida em parceria com Promenino/Fundação Telefônica Vivo, e publicada também no site Promenino, que reúne mais informações sobre combate ao trabalho infantil

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Consumismo, o 'aliciador' de trabalho infantil nas cidades

Por vontade própria e com o apoio dos pais, crianças e adolescentes realizam trabalhos degradantes para poder comprar bens como celulares e videogames

Por Sabrina Duran, da Repórter Brasil

A necessidade de um prato de comida já não é o único motivo a forçar crianças e adolescentes ao trabalho precoce e degradante. Na sociedade do consumo exacerbado e da publicidade ostensiva, outros itens pesam nas suas listas de urgências: celulares, tênis de marca e videogames são alguns deles. A pressão social para a aquisição desses produtos é tão grande que estes deixam de ser somente o bem conquistado e tornam-se os próprios “aliciadores”.

“Eles veem os colegas com celular e procuram trabalho. Muitos jovens são autônomos: compram computador, fazem cópias piratas de CDs e vão vender na rua para ganhar R$ 300, R$ 400 por mês. Hoje não são somente os pais que colocam os filhos para trabalhar. O consumismo atrai muita criança e adolescente”, afirma Luiz Henrique Ramos Lopes, chefe da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). De acordo com ele, desde a divulgação do Censo de 2010 é possível perceber que o trabalho infantil no Brasil não está mais tão ligado à pobreza ou miséria extrema.

Adolescente trabalha em uma borracharia  Foto: SRTE/PE

Fotos:  Divulgação/SRTE-PE

No âmbito urbano, onde a pressão do consumo é generalizada, os adolescentes são as “presas” mais fáceis para os empregadores. Além de estarem mais expostos do que as crianças ao apelo das propagandas, são os que mais trabalham nas cidades. “Os dados da PNAD [Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios] mostram que na faixa etária de 5 a 9 anos o trabalho é muito mais rural do que urbano. De 10 a 14, o urbano começa a se sobrepor. De 15 a 17 anos o trabalho infantil é proeminentemente urbano”, informa Lopes.

Entre as atividades em que a exploração da mão de obra de crianças e adolescentes é mais comum, segundo a fiscalização do MTE, estão feiras livres, comércios ambulantes, borracharias, lava-jatos e oficinas mecânicas. Todas essas atividades estão na lista de Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), aprovada como decreto federal em 2008 (veja a primeira parte da reportagem sobre a Lista TIP aqui).

A cidade e seus riscos
Paula Moreira Neves, auditora fiscal do MTE e coordenadora do Projeto de Combate ao Trabalho Infantil em Pernambuco, confirma que o consumismo, hoje, é um dos grandes desafios aos que combatem o trabalho infantil, especialmente nas cidades. “Existem crianças e adolescentes que são obrigados a trabalhar pela família ou são cooptados por terceiros nas ruas, mas muitos trabalham porque querem comprar bens que os pais não têm condições de lhes dar. Já que a maioria desses pais começou a trabalhar na infância, eles permitem e até estimulam que seus filhos façam o mesmo”, diz a auditora.

OLYMPUS DIGITAL CAMERASão muitos e graves os riscos para as crianças que desempenham atividades contidas na Lista TIP. No trabalho como vendedoras ambulantes nas ruas e outros logradouros públicos, por exemplo, elas estão sujeitas a violência, drogas, assédio sexual e tráfico de pessoas; e a exposição à radiação solar, chuva, frio, acidentes de trânsito e atropelamento. Nas borracharias, são submetidas a esforços físicos intensos e expostas a produtos químicos, antioxidantes, plastificantes e calor. Na lida dos lava-jatos, crianças e adolescentes estão em constante contato com solventes, neurotóxicos, névoas ácidas e alcalinas. Já os que trabalham como carregadores em feiras livres estão sujeitos a padecer de bursites, tendinites, sinovites, escolioses, lordoses e outras doenças músculo-esqueléticas decorrentes do intenso esforço físico. “Esses pais [que estimulam os filhos a trabalhar] desconhecem os graves prejuízos que o trabalho precoce ocasiona aos seus filhos, como a dificuldade de aprender, a defasagem e a evasão escolar, os danos físicos ao corpo ainda em desenvolvimento e os danos psicológicos”, alerta Paula.

Dificuldades de fiscalização
Em 2012, segundo a auditora, foram fiscalizadas feiras livres em 65 municípios de Pernambuco, além das praias de Boa Viagem, no Recife, e Piedade, em Jaboatão dos Guararapes. Nos casos em que os empregadores foram identificados, todos foram notificados e autuados. No entanto, informa Paula, a maioria das crianças e adolescentes encontrados naqueles locais trabalhava com os pais ou, embora prestasse serviço a um terceiro, estava desacompanhada do empregador e não sabia informar seu endereço.

Não conseguir identificar quem explora a mão de obra infantil nas ruas e outros locais públicos é uma das grandes dificuldades dos fiscais do MTE. Nas feiras livres de municípios do Rio Grande do Norte, a auditora fiscal e coordenadora do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil do estado, Marinalva Cardoso Dantas, relata a mesma dificuldade de Paula. “Às vezes temos de inventar, dizer que não somos do Ministério do Trabalho para poder conversar com as crianças, senão elas correm, mentem para não dizer o nome dos pais.”

trabalhoinfantilPara Paula Neves, a utilização de praias e outros logradouros públicos para o comércio deve ser regulamentada e fiscalizada pelo poder público municipal a fim de prevenir e coibir o uso da mão de obra infantil. “Condicionando, por exemplo, a autorização do uso do espaço público pelos barraqueiros e ambulantes à não utilização de mão de obra infantil”, sugere a auditora. Outras medidas importantes são a busca dessas crianças em situação de trabalho e sua inclusão em programas sociais e a realização de campanhas junto ao público em geral, especialmente com usuários de praias e feiras livres. “Que a sociedade pare de adquirir produtos e serviços das mãos de crianças e adolescentes que trabalham sob sol escaldante, descalços, expostos a riscos e diversos problemas de saúde decorrentes do trabalho precoce”, finaliza.


Esta reportagem foi produzida pela Repórter Brasil e faz parte da série de especiais Meia Infância, parte integrante da campanha É da nossa conta! Trabalho infantil e Adolescente

 

As piores formas de trabalho infantil

Lista com as atividades profissionais mais degradantes para crianças e adolescentes ainda é ignorada em diversas regiões

Por Sabrina Duran, da Repórter Brasil

Em 2008, um decreto assinado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva permitiu que o combate ao trabalho infantil no país se tornasse mais abrangente, ampliando as possibilidades de punição contra indivíduos e empresas que o utilizam e, principalmente, protegendo muito mais crianças e adolescentes que todos os dias são submetidos a atividades degradantes no campo e na cidade.

O decreto de número 6.481, assinado em 12 de junho daquele ano, aprovou, em nível federal, a Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), que teve suas bases lançadas em 1999 pela Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Constam da relação 89 atividades, com suas descrições e consequências para a saúde de crianças e adolescentes que as desempenham. Há ainda outros quatro itens convencionados anteriormente pela OIT e que se referem à exploração sexual, trabalho escravo, trabalhos moralmente degradantes e uso da mão de obra infantil em atividades ilícitas, como o tráfico de entorpecentes. A Lista TIP foi elaborada durante quase três anos por membros da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti), coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Fotos: Divulgação/SRTE-MT

Fotos: Divulgação/SRTE-RN

“Antes do decreto, essa lista era aprovada em forma de portaria pelo MTE. Mas nós queríamos que tivesse uma abrangência maior, porque talvez uma atividade de subsistência e o ato de pedir esmola na rua ou fazer malabares não fossem considerados empregos e, por isso, não seria competência do MTE [fiscalizar]. Como foi um documento preparado por vários ministérios juntamente com a Conaeti, centrais sindicais e confederações patronais, optou-se por fazer um decreto, um documento mais forte que o governo inteiro tem de aceitar”, explica o chefe da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil do MTE, Luiz Henrique Lopes.

Para ele, além de dar mais peso e abrangência ao combate do trabalho infantil, a Lista TIP desmistifica sensos comuns que, de alguma forma, perpetuam a cultura da exploração de crianças e adolescentes. “Buscamos estudos que comprovassem a periculosidade das atividades, justamente para desmistificar pensamentos como ‘trabalha na carvoaria, então é perigoso; trabalha no âmbito urbano, então não é perigoso’. Não há ‘achismo’ na lista. Colocamos estudos científicos que embasam nossas escolhas.”

Entre 8 e 10 de outubro o Brasil sediará, em Brasília (DF), a III Conferência Global sobre Trabalho Infantil. Embora seja um evento mundial, o país tem participação especial porque, segundo Lopes, é referência no combate a esse tipo de exploração. “Não fazemos distinção entre trabalho rural ou urbano, nem de idade ou de gênero. Temos o compromisso de até 2016 acabar com as piores formas de trabalho infantil”, afirma.

Desafios no campo
Embora a criação da Lista TIP e o trabalho de fiscalização tenham ajudado a reduzir o uso de mão de obra infantil, ainda há sérias dificuldades que impedem a erradicação das piores formas de trabalho. E é no âmbito rural que essas dificuldades são mais evidentes. Faltam fiscais e suporte das autoridades locais; sobram ameaças de empregadores e até de figuras políticas a auditores do MTE. No campo, as distâncias a serem percorridas são longas, de difícil acesso e, muitas vezes, o medo da população de oferecer informações dificulta as ações de inteligência do MTE na busca de focos de exploração.

Outro grande entrave é de ordem cultural. Não apenas empregadores, mas os próprios familiares de crianças e adolescentes acreditam estar fazendo um bem ao colocá-las para trabalhar. “O que mais ouvimos é que se a criança não trabalhar vai cair nas drogas. Ou seja: as únicas opções para as crianças são o trabalho ou as drogas. Para mim, essa é uma crença perversa”, diz Roberto Padilha, coordenador do Projeto de Fiscalização do Trabalho Infantil da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Rio Grande do Sul (SRTE/RS).

Quando a família é o empregador
Segundo Padilha, um dos principais focos de combate ao trabalho infantil no estado, hoje, está no cultivo de fumo, que consta da Lista TIP. Esforço físico e posturas viciosas; exposição a poeiras orgânicas e seus contaminantes, como fungos e agrotóxicos; acidentes com animais peçonhentos; e exposição, sem proteção adequada, à radiação solar, calor, umidade, chuva, frio e acidentes com instrumentos pérfuro-cortantes aparecem na lista como prováveis riscos ocupacionais à criança ou adolescente que trabalha na lavoura de fumo. Bursites, tendinites, urticárias, doenças respiratórias, mutilação e câncer são apenas algumas das consequências para a saúde. Um agravante contra o bem-estar das crianças nesse ambiente é a liberação de substâncias tóxicas pela própria planta do fumo.

menina

O cultivo costuma ser feito em pequenas propriedades familiares onde trabalham pais e filhos. “Ainda existe muita resistência a entender as consequências do trabalho infantil”, descreve Roberto Padilha. Na fiscalização dessas lavouras, o trabalho dos auditores do MTE é distinto do realizado em propriedades de empresas. Não há autuação dos empregadores ou afastamento das crianças do trabalho, mas sim orientação e um esforço, por meio da informação e do diálogo, de substituir o trabalho pela educação. “A instrução normativa 77, que regulamenta nossa atuação nas lavouras de economia familiar, diz que nosso trabalho é de orientação às famílias e de articulação com outros órgãos parceiros, como assistência social, Conselho Tutelar, Ministério Público do Trabalho e órgãos de educação”, explica Padilha.

O objetivo dessa parceria é promover atividades de capacitação profissional das famílias e atividades alternativas ao trabalho das crianças no campo, alertar nas escolas sobre o risco do trabalho infantil e estimular a cadeia produtiva a adquirir apenas produtos que não utilizem mão de obra de crianças. “O trabalho infantil não é elemento de desenvolvimento econômico ou social. Ele abala o desenvolvimento físico e provoca evasão escolar. O Brasil carece de mão de obra qualificada para ocupar cargos mais bem remunerados. Nesse sentido, o trabalho infantil é também um elemento de degradação econômica”, completa o coordenador do Projeto de Fiscalização do Trabalho Infantil da SRTE/RS.

“Constituição é bobagem”
Jovens de 13, 14 anos, sentados no chão úmido e sujo, respirando o ar poeirento, manuseando facões e outros instrumentos cortantes. Durante uma manhã inteira eles não se levantam, não bebem água e não vão ao banheiro, para não perderem tempo. Ao fim da jornada, cada um tem como saldo da lida meia tonelada de mandioca descascada sobre as pernas e os problemas crônicos na coluna e nos rins que o trabalho na casa de farinha lhes dá como “paga”, além dos R$ 20 semanais, em média.

Marinalva Cardoso Dantas, auditora fiscal do trabalho e coordenadora do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil do Rio Grande do Norte, é quem descreve a situação de trabalho dos adolescentes nas casas de farinha – atividade que consta na Lista TIP – espalhadas pelas áreas rurais do estado.

Assim como no caso das lavouras de fumo familiares no Rio Grande do Sul, a questão cultural é um dos grandes entraves para a fiscalização do MTE no Nordeste brasileiro. “A cultura local diz que criança deve sempre trabalhar para não virar marginal. A população pensa assim, os vereadores pensam assim, pessoas da prefeitura, comerciantes, até o padre acha normal criança trabalhar”, diz Marinalva.

Na defesa das próprias convicções culturais – e dos benefícios financeiros do uso da mão de obra infantil, que não custa quase nada a quem a explora –, os empregadores e os que concordam com suas ideias chegam a protagonizar situações absurdas, como o episódio vivido há três anos por Marinalva e outras três auditoras em Boa Saúde, cidade com menos de 10 mil habitantes no agreste potiguar.

Após tomarem conhecimento da morte, por choque elétrico, de uma criança numa casa de farinha, elas iniciaram um trabalho de conscientização na cidade e convocaram uma audiência pública na Câmara Municipal local. “Só saímos de lá depois de meia-noite porque fomos obrigadas a ficar ouvindo todos os desaforos dos vereadores, que diziam que a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente são besteira, que não queriam ninguém de fora dizendo como eles deveriam cuidar dos meninos da cidade. A plateia aplaudia tudo o que diziam. Para eles, é normal uma criança morrer de choque elétrico numa casa de farinha. E aquele não tinha sido o primeiro caso.”

Naquela ocasião, as auditoras afastaram onze crianças do trabalho. Mas poderiam ter afastado mais. “Como as casas de farinha são próximas, quando a gente chega na primeira, as pessoas já vão de moto e bicicleta avisar nas outras, e depois não encontramos mais ninguém”, conta a auditora. Depois daquele incidente na Câmara Municipal de Boa Saúde, Marinalva nunca mais voltou à cidade. “Só volto com acompanhamento da polícia e alguém do Ministério Público”, diz.

Matadouros no RN
Com tradição no comércio de carne de sol, o Rio Grande do Norte é pródigo em abatedouros. O trabalho nesse ramo está diretamente relacionado à pecuária, pode ser encontrado no campo ou na cidade e, no que diz respeito ao uso de mão de obra infantil, consta da lista das piores formas de trabalho.

No estado, a erradicação do trabalho de crianças e adolescentes no abate do gado é um grande desafio para o MTE também por causa do traço cultural e familiar da atividade. “Em geral, são filhos de vaqueiros e peões levados pelos próprios pais a trabalhar ali. O trabalho vai passando de pai para filho.” Em seu relato cru, Marinalva diz que já encontrou adolescentes matando boi a marretadas, tirando a pele, fazendo sangria, limpando as vísceras e as fezes. “Já entrevistei um menino que disse que bebia com cachaça o sangue do boi que jorrava do pescoço. Outro disse que treinou matar boi matando gato na rua a pauladas, como vê o pai fazer com o boi. Esses meninos veem gente matando gado, gado matando gente, gente matando gente. A violência, a morte e a vida para eles são algo muito banal”, afirma.

Segundo a auditora, entre os mais de 160 municípios do Rio Grande do Norte, pelo menos cem abrigam locais de abate, muitos pertencentes às prefeituras. Nas cidades de João Câmara, Nova Cruz, Caicó, Acari e Bom Jesus, por exemplo, a fiscalização flagrou trabalho infantil em matadouros públicos. “Há matadouros onde o gado do próprio prefeito é abatido por crianças”, revela Marinalva.

Outro problema para o combate a esse tipo de atividade é o fato de as crianças serem recrutadas por via indireta e, formalmente, não serem empregadas da prefeitura, o que impede os fiscais de autuarem a administração municipal. Uma solução legal, porém, foi encontrada recentemente. “Descobrimos que podíamos fazer um auto de infração onde não é mencionada a palavra ‘empregado’, e sim ‘manter em serviço pessoas com menos de 16 anos’. Com isso, começamos a autuar prefeituras no caso das feiras livres. Isso foi considerado um avanço. Agora, vamos usar esse instrumento nos matadouros porque a situação é a mesma”, explica a auditora.

Ela adianta que o estado prepara uma fiscalização para flagrar trabalho infantil em matadouros clandestinos, cujas condições de insalubridade e exploração são iguais ou piores do que nos matadouros legalizados. Currais Novos, polo de carne de sol do Rio Grande do Norte, será um dos alvos da fiscalização. “Sabemos que estão abatendo animais em sítios. A matança é tão grande que os bois da região não dão conta, e eles trazem gado do Tocantins”. A ação dos auditores nos matadouros clandestinos terá apoio da Polícia Rodoviária Federal e contará com a presença de juízes que solicitaram acompanhar algumas fiscalizações como observadores. “Eles querem sentir a realidade da exploração das crianças. Quando o caso chegar à sala deles, saberão julgar com mais precisão”, informa Marinalva.

Na segunda parte desta reportagem você conhecerá detalhes sobre o combate às piores formas de trabalho infantil no âmbito urbano.


Esta reportagem foi produzida pela Repórter Brasil e faz parte da série de especiais Meia Infância, parte integrante da campanha É da nossa conta! Trabalho infantil e Adolescente